O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou nesta segunda-feira (9) que o Congresso Nacional não tem compromisso com a aprovação da medida provisória (MP) que será enviada pelo governo como alternativa ao decreto que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A declaração foi feita durante um seminário promovido pelo Grupo Globo com representantes do mercado financeiro.
“Não há do Congresso, é importante aqui registrar, o compromisso de aprovar essas medidas que vêm na MP. A MP será enviada apenas para que, do ponto de vista contábil, não se tenha que aumentar o contingenciamento”, explicou Motta, sinalizando resistência do Legislativo em relação à proposta do Executivo.
A medida provisória ainda não foi oficialmente apresentada, mas deve conter alternativas para compensar a suspensão do decreto do IOF, que previa arrecadar R$ 20 bilhões neste ano. O governo também anunciou um bloqueio orçamentário de cerca de R$ 30 bilhões para cumprir a meta fiscal estabelecida pelo novo arcabouço.
Segundo o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), o posicionamento de Hugo Motta é natural e faz parte do processo de negociação. “A fala do Hugo agora não é nada demais. É uma fala natural porque, inclusive, não tem texto da medida provisória. E isso vai ser uma construção”, afirmou o parlamentar em entrevista a jornalistas em Brasília.
Alternativas à arrecadação via IOF
Diante da reação negativa do Congresso e do mercado financeiro ao aumento do IOF, o governo federal tem negociado uma nova medida provisória que inclua alternativas de arrecadação. Entre as propostas estão:
- Aumento da taxação sobre as casas de apostas on-line (as chamadas “bets”);
- Cobrança de 5% sobre títulos atualmente isentos, como LCA (Letra de Crédito do Agronegócio) e LCI (Letra de Crédito Imobiliário);
- Taxação dos juros sobre capital próprio (JCP);
- Corte de 10% nos benefícios tributários não previstos na Constituição.
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) já se manifestou contrária à taxação das LCAs. Atualmente, estima-se que o governo deixe de arrecadar cerca de R$ 800 bilhões por ano com isenções fiscais.
Desvinculação de gastos com saúde e educação
Hugo Motta também voltou a defender mudanças estruturais nos gastos públicos. Entre elas, sugeriu a desvinculação dos pisos constitucionais da saúde e da educação. A Constituição prevê um percentual mínimo de investimento nessas áreas, mas a proposta de Motta abriria espaço para cortes mais amplos.
“Não havia interesse do governo em debater essas pautas, as pautas estruturantes, debater o corte das isenções fiscais, debater o que nós podemos avançar na desvinculação sobre saúde e educação”, declarou.
Essa proposta também inclui o fim do reajuste automático das aposentadorias com base no salário mínimo — o que pode afetar significativamente aposentados que recebem o piso nacional. A ideia é defendida pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), relator da reforma administrativa e aliado de Motta.
PT se opõe a cortes em programas sociais
O líder do PT, Lindbergh Farias, afirmou que a legenda se opõe de forma contundente a essas mudanças. “Nós somos contra, muito contra. Desvincular salário mínimo da Previdência, sinceramente, um aposentado que ganha um salário mínimo. Essa desvinculação é criminosa. É a gente tratar o ajuste em cima dos mais pobres”, criticou.
Para ele, o governo já fez cortes significativos, como o contingenciamento de R$ 30 bilhões e o pacote de ajuste fiscal aprovado no ano anterior, que limitou a valorização real do salário mínimo. A estimativa é que esse pacote resulte em uma economia de R$ 327 bilhões em cinco anos.
Críticas ao modelo atual de responsabilidade fiscal
O novo arcabouço fiscal, aprovado em 2023, substituiu o antigo teto de gastos e obriga o governo a cumprir metas de resultado primário — que excluem os pagamentos de juros da dívida pública. No entanto, despesas obrigatórias com saúde, educação e previdência têm crescido mais rapidamente do que o arcabouço comporta, exigindo cortes ou aumento de receitas para o equilíbrio fiscal.
Hugo Motta criticou a postura do governo ao transferir a responsabilidade das medidas impopulares para o Congresso. “Chegou um momento da discussão que um determinado ator importante do governo disse que vai ter um shutdown [paralisação da máquina pública] se derrubar a medida do IOF. E talvez seja o que o país esteja precisando para todo mundo sair da sua zona de conforto”, afirmou.
Já Lindbergh alertou que o foco do ajuste não pode recair sobre os mais pobres. “Quando aperta, o andar de cima não quer pagar nada. Só gosta de fazer ajuste em cima de programa social, de corte na saúde e na educação, mas não quer dar sua contribuição. Esses temas têm que ser enfrentados”, concluiu.